SOB AS SUAS ORDENS, MPLA CRIA ORGANISMO IN… DEPENDENTE

O Observatório da Economia Informal (OEI) em Angola entrou hoje em funcionamento, reunindo empresas, sindicatos, governo e sociedade civil, com o objectivo de propor medidas para reduzir o trabalho informal, que ocupa quase dois terços da população angolana.

O organismo que é tão independente a ponto de ser coordenado pelo Ministério da Economia e Planeamento (MEP), é composto por 40 instituições, maioritariamente da sociedade civil, entre associações profissionais, cooperativas, universidades, sindicatos e – reforçando o seu estatuto de independência – 17 órgãos ministeriais.

Segundo as autoridades angolanas, o OEI pretende ser um fórum alargado de articulação, concertação e diálogo social permanente sobre a formalização da economia informal de Angola, tendo como missão elaborar medidas nesse sentido.

A secretária de Estado para a Economia angolana, que discursou na abertura da primeira reunião constituinte, referiu dados publicados em 2018 pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pelo Banco Mundial (BM) que davam conta que cerca de 72,6% da população economicamente activa em Angola tinha um emprego informal.

“Estes são os dados actuais com que estamos a trabalhar e o executivo naturalmente por via do PREI [Programa de Reconversão da Economia Informal], e o seu lançamento a nível das 18 províncias, está a desenvolver acções para reduzir os patamares da informalidade da nossa economia”, disse Dalva Ringote.

O OEI, “que é um órgão de auscultação e concertação entre o sector público e privado e as organizações não-governamentais e cooperativas, é um órgão importante porque tem a responsabilidade de garantir, auxiliar na formalização e acompanhamento das políticas das acções tendentes à formalização”, referiu.

Este órgão deve também elaborar estudos, “porque também está incorporada neste órgão a academia, que tem a função de apresentar estudos concretos para auxiliar as políticas voltadas à formalização, que tem a função de garantir que todo o processo decorra de forma suave”.

Dalva Ringote disse estar certa que os membros do OEI “poderão contribuir para garantir que a política de formalização da actividade económica se concretize e vamos continuar a trabalhar em busca dos resultados tangíveis no decurso das acções de concertação”.

“Hoje é a criação do secretariado, que será eleito formalmente, e portanto a continuidade do processo de formalização da actividade que vai decorrer pelo país vai merecer atenção deste importante órgão de formalização”, assegurou.

Recordou que o PREI, lançado oficialmente em 16 de Novembro de 2021, deve atingir os 164 municípios: “E estão em curso as acções conducentes à materialização”.

“Esperamos ter nos próximos tempos o plano operacional elaborado, para então continuarmos o processo de formalização da actividade económica dos municípios”, rematou a secretária de Estado angolana.

Já a secretária executiva constituinte do OEI, Elsa Sarmento, deu conta que o órgão deve aprovar um conjunto de aspectos normativos, referindo que o fórum, apesar de ser coordenado pelo MEP, foi dotado de “autonomia técnica, científica e administrativa”.

Neste sentido, “é o primeiro observatório de iniciativa governamental criado nestes moldes como um fórum verdadeiramente independente onde os organismos diversos estão em pé de igualdade numa discussão com 17 instituições públicas, totalizando 40 entidades”.

“Numa grande família que pretende debater o bem-estar socioeconómico e o processo de formalização da economia de forma a promover a coesão social e aumentar o desenvolvimento socioeconómico de Angola”, assinalou Elsa Sarmento.

O Governo anunciou, na passada semana, que formalizou cerca de 200.000 operadores informais com a implementação, há sete meses, do PREI e disponibilizou 2,6 mil milhões de kwanzas (5,6 milhões de euros) em microcrédito.

Segundo o ministro de Estado para a Coordenação Económica, Manuel Nunes Júnior, a maior parte dos operadores retirados do circuito informal são mulheres, sobretudo jovens entre os 15 e os 40 anos.

A culpa é dos taxistas, zungueiras e domésticas

O Governo quer (é, pelo menos, o que diz) retirar, entre outros grupos-alvo, taxistas, empregadas domésticas e vendedores de rua, do mercado informal, que absorve cerca de onze milhões de pessoas, um terço da população de Angola. Não o faz por uma questão de equidade social mas, apenas e só, porque quer arrecadar dinheiro dos impostos que, desta forma, não consegue fazer.

Segundo o secretário de Estado do Trabalho e Segurança Social, Manuel Moreira, a título de exemplo, só o sector de táxis, ainda informal, representa anualmente um negócio de 1.000 milhões de dólares (cerca de 900 milhões de euros) em que o Estado se vê privado dos respectivos impostos.

“O Plano de Acção para a Promoção da Empregabilidade (PAPE) (aprovado a 21 de Abril de 2019 pelo Presidente, João Lourenço, que disponibilizou 58,3 milhões de euros para promover o emprego), entre as várias actividades ou atribuições que tem, uma delas é a questão da certificação e formalização da economia informal”, sublinhou Manuel Moreira.

Destacando os domínios dos táxis, empregadas domésticas e os vendedores de rua ou em mercados municipais e provinciais, Manuel Moreira admitiu que o caminho é “problemático”, mas sublinhou que se pretende trabalhar com várias entidades e associações para combater o mercado informal e formalizar a economia.

“Nesta economia informal, há grupos alvo. Um deles é o dos taxistas, outro o das empregadas domésticas, vamos trabalhar com os mercados municipais e provinciais, uns formais outros informais, e, depois, vamos, no âmbito do que é a demanda da economia, criar perfis profissionais que se adeqúem a essa promoção de empregabilidade”, referiu o governante.

“Isto vai contribuir fortemente para a criação de emprego, porque estamos a falar de uma economia informal na ordem dos 60 a 70%, o que significa dizer que estas pessoas têm rendimentos, têm meios de trabalho, têm horários, só não fazem parte da economia, e não cumprem as obrigações fiscais nem as parafiscais, nomeadamente as relacionadas com a segurança social. É um problema de hoje”, acrescentou.

Segundo Manuel Moreira, e citando dados recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE), estima-se em cerca de nove milhões (hoje são mais) de cidadãos que labora no mercado informal, pelo que o desafio é “grande”.

Instado a explicar como pode ser feita a formalização das profissões, Manuel Moreira exemplificou com o caso dos táxis, havendo já conversas com as respectivas associações.

“Queremos pegar nos taxistas, dar-lhes formação específica – conduzir pessoas não é o mesmo que conduzir carga ou animais -, e atribuir a carteira profissional que o habilita ao exercício da actividade. Com isso, a partir do momento em que se atribui a carteira profissional, formaliza-se a actividade”, respondeu, admitindo que, a partir daí, começa um “novo problema”.

“Aí teremos de resolver a situação a nível de alguns ministérios, porque vamos precisar da Justiça, das Finanças, do Comércio, dos Transportes, enfim, para que aquela actividade seja rapidamente formalizada, sem grandes dificuldades, para que, depois, possa então passar a contar para as estatísticas, para o PIB (Produto Interno Bruto) e para a economia”, sublinhou.

Segundo Manuel Moreira, e continuando no sector dos táxis, a respectiva associação estimou em cerca de 1.000 milhões de dólares o volume bruto que rende a actividade anualmente – “por aí podemos ver o quanto o Estado não capitaliza nesses casos”.

Manuel Moreira reconheceu que a taxa de desemprego – o INE indicou a 20 de Abril de 2019 que se situa nos 28,8% – não reflecte a real situação económica do país, porque tem de se considerar que o sector da economia informal “emprega muita gente”.

Com um esforço combinado entre o sector público e privado, considerou, é possível “amenizar a questão do desemprego”, disse, apontando o PAPE, que apresenta acções muito concretas para ajustar perfis profissionais dos jovens aos sectores da Indústria, Turismo, Agricultura, Comércio e Pescas.

Na perspectiva do Presidente João Lourenço, o diploma relativo ao PAPE deveria também “contribuir para a bancarização e educação financeira das famílias” e para “o processo de reconversão da economia informal para a formal”.

“Apesar da grande oferta de mão-de-obra existente”, refere-se no decreto, “o sector produtivo da economia não tem capacidade para absorver a força de trabalho disponível”, pelo que terá de se resolver “uma situação de desemprego estrutural”.

Desemprego, miséria, pobreza… MPLA

Reduzir a taxa de incidência da pobreza de 36% (segundo as deficientes contas do regime) para 25% da população, do índice de concentração da riqueza de 42,7 para 38, e “criar e implementar o Rendimento Social Mínimo para famílias em situação extrema de pobreza” são – repete João Lourenço – objectivos. Como é que isso se consegue? João Lourenço não explica. Nem precisa de explicar.

“Erradicar a fome em Angola” (que, afinal, não existe ou é realtiva), aumentar em cinco anos a esperança de vida à nascença, elevando-a para 65 anos, reduzir a taxa de mortalidade infantil (uma das maiores do mundo segundo organizações internacionais que não leram o manifesto do regime) de 44 para 35 por cada mil nados-vivos e de crianças menores de cinco anos de 68 para 50 por cada mil nados-vivos, são outras metas do MPLA de João Lourenço.

Como vai fazer isso? Isso não interessa saber. Aliás, as promessas não carecem de justificação nem de explicações sobre a forma de (não) serem cumpridas. Basta a palavra do “querido líder”.

No plano económico, e com o país a tentar recuperar da crise financeira, económica e cambial de 2015 e 2016 (que só atingiu os angolanos de segunda categoria), João Lourenço avisou que as empresas públicas deficitárias serão entregues à gestão privada, para que deixem de “sugar os recursos do erário público”.

Não fosse apenas mais um capítulo do anedotário do regime e, certamente, os angolanos até ficariam sensibilizados com essa de “sugar os recursos do erário público”. Por outras palavras, promete acabar com aquilo que, ao longo de 46 anos, foi a única estratégia do seu MPLA: “sugar os recursos do erário público”.

Entre os fundamentos macroeconómicos, João Lourenço promete “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, assume o compromisso de atingir uma média de crescimento anual “não inferior a 3,1%” do PIB, reduzir a taxa de inflação a um dígito ou duplicar a receita tributária não-petrolífera.

Tudo isto já não são bem promessas do MPLA de João Lourenço. São, antes, um atentado à inteligência dos angolanos e a passagem de um atestado de matumbez também às organizações internacionais que dão cobertura ao regime, mostrando que preferem trabalhar com um partido (MPLA) incompetente às segundas, quartas e sextas e que às terças, quintas e sábados procura esconder essa incompetência (ao domingo… descansam).

Folha 8 com Lusa

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